Irrealidade Extraído da obra Censurável de M. Kula

domingo, 16 de dezembro de 2007


Adorava ter sido realizador ou escritor pintor poeta indubitavelmente actor ou encenador passando por, porque não, massagista futebolista barman tenista ou amante de golfe, taxista ou apresentador televisivo... Militar policia banqueiro terrorista... Poderia até ter sido Deus, mas tenho fobia à adoração.

Apenas tento manter limpa na minha memória a ideia de que algo, ainda consegue manter-me um passo atrás em vez de um para a frente do balcão da minha varanda. É que tenho feito coisas inúteis ultimamente e isso levou-me a apenas um pé para a frente, e é o meu fim... O meu fim já... Apenas fiz 23 primaveras... Não posso morrer... Tenho ainda uma existência interminável pela frente, não sou velho e quero pelo menos ter um ou dois ou vários filhos até... Mas não aguento mais este tilintar do relógio tic tac tic tac tic tac...

Tudo começou à dois meses atrás, antes dessa altura considerava-me melhor... Quero dizer com boa apresentação, um ar jovial e um sorriso de presidente... Mas tudo partiu... Partiu porquê...?

A vida é mesmo uma luta incessante de interesses despropositados por um acordeão sagrado, no qual não entendemos nada do... Do ré mi fa sol la si do dessa incessante busca de auto-realização onde pomos os pés numa realidade débil, onde os raios do sol apenas nos revoltam contra a asquerosa visão de prédios... Prédios... E mais prédios nos quais apenas encontramos compartimentos privados e secretos, atracados a uma senil esquizofrenia de estarmos sós...

Sós perante a imensidão do oceano dos nossos desejos cada vez mais perdidos e longínquos do velho ancião que internamos num lar não muito longe da exclusão social que ditatorialmente nós os jovens condenámos. Condenámos esse idoso que nos repugna por estar vivo e ter vivido mais do que nós...



Stupidity.



Faz dois meses que não durmo em condições, aliás já não sei o que é dormir e ter sonhos, dormir exaustivamente até ser dia... Dia de fazer algo pela nossa vida... Sei que pode parecer insensato... Mas sinto-me seguido... Não por pessoas normais... Já me habituei a estes predadores patéticos da sociedade demente da qual não me sentirei como elemento indispensável ao luar do amanhã nascente algures no oriente escondido no fim do rio fertilizador da razão em ser neurótico e exaustivamente dispensável.

A pessoa que me tem seguido não é deste mundo... Não sei explicar mas segue-me por todo lado... Sinto a sua presença vil... Observa-me e quando está muito perto de min...

Sinto a sua respiração horripilada não sei dizer porquê... Pela inexplicabilidade deste meu medo racional em estar completamente perdido neste aglomerado centro comercial de betão antisocial.

Ás vezes, pela noite, tenho calafrios onde a minha pele estremece... Os pelos irritam-se com excessivo tremer das minhas pernas out of control...

Mantenho-me calado... Mas nada irrompe... Silêncio total e assustador... Nada sai... Nada mexe...

Nada acontece... Estarei a enlouquecer a olhos vistos?... Não... Não pode ser... Sou um ser racional em que os esquematismos mentais regulam a existência serena de todos os dias... Mas não... Sinto algo perto de mim... Sempre a tentar erradicar o meu desejo de viver feliz... Quem sabe contigo ao meu lado... Mas não... Nada acontece... Já são 4 horas da manhã vou dormir ou pelo menos tentar dormir.

A noite já passou and the sun já delimitou o seu território... Acordo e para minha incredibilidade assisto a uma visão perplexa de um quarto agora completamente desarrumado... Quem ou o quê que desarrumou o meu quarto? ... Porque não ouvi nada? ... Verifiquei que a chave da minha porta de entrada estava sem dúvida alguma muitíssimo bem trancada. Arrumei o meu quarto e não pensei em mais nada... Pelo menos à luz do dia.

Passeei pela cidade incógnito no meio de transeuntes anónimos atropelados, pelo sururu infinito de buzinadas angustiantes mas onde incrivelmente me senti seguro, seguro por não ter tempo nenhum para concentrar-me em intermináveis problemáticas quotidianas... De opressão sadia frequente em jovens perdidos na bruma da existência boreal. Os pássaros emitem o seu chilrear incessante onde ecoa o melodioso e calmante solo purificador do melro gozista... E abolicionista do caos sonoro que domina a cidade em isolação natural... Parei no centro comercial dos desencontros sociais onde tomei um café, fumei um cigarro e observei a vasta gama de personagens incoerentes e decadentes que cada vez mais povoam a cidade.

Por volta das 19 horas voltei a casa para jantar, ficando em seguida grudado frente aquela caixa de onde sai uma realidade bastante diferente da realidade que vivemos, ou pelo menos em que vivo. Tomei um café forte... Sei que me esperam várias horas de insónias pela frente. 0 horas e 30, não aguento e tomo um whiskey e espero que o ser desconhecido volte, estando eu decidido a fazer-lhe frente após 3 copos bem doseados de whiskey. 1 hora, chegou a hora de ele vir, normalmente é a essa hora que ele ou ela costuma aparecer, acendi um cigarro e esperei devotadamente pela aparição.

E cá está... Sinto a sua presença novamente... Arrepios pela coluna vertebral... Pêlos eriçados...

Pernas trementes... Mas desta vez sinto um frio glaciar... Aliás todo meu quarto está congelado... Tento falar com o outro ser... Mas nada... Outra noite em branco e outro acordar com o quarto desarrumado e assim sucessivamente... Passava os dias em parques urbanos ouvindo os pássaros... Ah como a cidade é bela ao som dos pássaros. Ao fim ia para os centros comerciais das figuras ambulantes tomar um café, fumar um cigarro... Só voltava a casa para jantar... Fugindo após para o refúgio do palco teatral do renascimento onde acabava a noite bebendo um whiskey no bar das afinidades culturais... E mais bebendo outro e outro e outro ainda... Apenas dormia graças ao álcool e calmantes antidepressivos... E assim foram os meus dias até decidir enfrentá-lo.

Esse dia correu particularmente mal, entornei um café em pleno centro comercial onde todos os olhares da galeria ambulante de anónimos me cruzaram como victim on target. O meu jantar saiu ensosso assim como entornei um copo de vinho sobre as minhas calças de combate. Todo complexado pelos acontecimentos ocorridos encadeados e certinhos de... será dessa que vou morrer?... Ele vai matar-me!?... Tenho 23 anos e não quero morrer... E bebi... Bebi mais um whiskey e outro e outro e mais outro... Até que se aproximou de mim a hora de morrer... Comecei a caminhar passo a passo, ideia a ideia para a varanda aberta frente ao meu quarto... Estou arrepiado... A onda glaciar do meu tormento gelou-me a razão... Estou a um passo do fim... A coruja cuja memória não me esqueço juntou-se a mim... E ele está cá... Observa-me e toca-me... Não o vejo... Não sei o que é... Junto todas as minhas forças para tentar lutar contra esse estranho ser omnipresente... Deixo a varanda e consigo voltar para o meu quarto apesar de todo o arrepio... Largo o meu ser... Sinto a sua presença perto de mim... Arrepiei-me... Ele está bem perto... Sinto o seu vibrar... Vou morrer... Chegou a hora... Mas não... Sinto-o a guiar-me pelo quarto... Guiado até a minha escrivaninha onde deixo repousar os livros que me me fazem viver...

E claro!...


Só pode ser?!...


MAUPASSANT... Cette nuit, j´ai senti quelqu´un accroupi sur moi, et qui, sa bouche sur la mienne, buvait ma vie entre mes levres... Adoro o seu escrever a emoção de simples realidade... A realidade inquietantemente terrível.

A partir desse dia mais nada de grave me aconteceu.

Apenas escrevo.





Extracto de Saída de M.Kula

terça-feira, 11 de dezembro de 2007


Chego à sala e estão todos já instalados no sofá. Todos grudados frente ao televisor. Digo uma piada de mau gosto, uns risitos e tudo volta à normalidade de absorção televisiva. Tento distrair-me e caio em inércia, não falo em quase nada de jeito porque quase nada me absorve. Estou num estado analítico mais preocupado comigo mesmo do que com o mundo. Estou preocupado com o meu amanhã que nunca chega. Com a minha ida que me cativa para uma existência de momentos que se perdem nas tramas do tempo e da memória que absurdamente nos fluiu pelo cérebro em momentos we´re out of control.
Não vou dizer nada acerca da minha partida. Nem nota, nem carta, nem nada, sei que isso jogará a meu favor na surpresa do reencontro futuro.
Mantenho-me presente mas distante.
O jantar foi feijoada à transmontana acompanhada por vinho maduro alentejano. A Mónica bebeu sumo e o resto de nós... Pedro... Ana e Chinês atacamos o vinho. O jantar foi divertido e demorado e uma das particularidades que me degusta mais são as gatas da Ana. A yin e a yang como costumo brincar, visto uma ser siamesa e a outra preta. O reverso uma da outra. Duas posturas felinas demarcadas. Duas personalidades adversas... Uma exuberante miadeira e outra silenciosa como o tempo e... E... Ah... Como se complementam em lutas de ballets de graciosidade felina.
Já são 22h3o. Já é essa hora de se sair de casa, está-se naquela hora em que parece que a casa nos repulsa e que se precisa de tomar ares da noite. Pode não ser o caso de toda a gente, mas para mim está na hora de se tomar um café. Decidimos ir ao Canoa, sempre há jeropiga no fim do café e na noite toda a gente sente que tem autorização para ser alcoólatra.


Triste realidade extraído de Lyric Intuition de M.Kula

sexta-feira, 7 de dezembro de 2007


Não sei o que busco

Não sei que serei

Idealismo debaixo da matéria

Sonhos abandonados

Apropriados

Almas corruptas

Assim devemos ser


Neste mundo só se é o que se tem

Triste realidade


Quando somos jovens sorrimos

Acreditamos mudar o mundo

Só importa ser

Viajar pelos mundos

Conhecê-los e respeitar-los

Sermos diamantes brutos sem estar-se a venda

Por um tempo

Assim costumamos ser


Neste mundo só se é o que se tem

Triste realidade


Mais tarde adultos

Quando já não necessitamos de ar para respirar

Honesty is no longer a excuse

Tudo é negro e branco sem moral nem bons costumes

Queremos ter

Imensuravelmente ter mais

Queremos ser lordes

Sacrificamos tudo em nome dessa bandeira

Terras, plantas, animais, casas, barcos, continentes, sub continentes, penínsulas, ilhas, eras, anos, horas...

Tudo tem o seu preço

Ter, ter, ter, ter....

ter, ter...ter...

Ter

Assim acabamos por ser


Neste mundo só se é o que se tem

Triste realidade


Para aqueles que não se corrompem

Para aqueles que nada temem

Para aqueles que acreditam que...

Ser e não ter-se é a solução

A vida será algo mais que uma triste realidade.

Será aquilo que deve ser

Aquilo que poderá ser


Aviso-te!


Nem sempre se é aquilo que se tem

Se é sempre pior


Ouve...

Ouve atentamente o vento


Vês!?


O vento sempre silba esta triste realidade

E o ar...

O ar sempre transpira esta bonita fatalidade.





Extracto de Saída (ensaio narrativo de Misha Kula)

terça-feira, 4 de dezembro de 2007

Se algum dia escrever... Espero ser um daqueles escritores que quando se lê... Não se percebe mas sim há de certa forma aquela harmonia de alguma maneira imposta entre uma escrita TNT/abstracta mas pura no sentido de sair muitas vezes sem explicação mas sim de facto em valor escrito nesse próprio impróprio acto de escrever.

No fim quem ganha vida... Eu ou as linhas que me escreveram...

Gosto de considerar qualquer acto escrito como um processo criativo.

É beber-se nessa iced cup onde encontrámos essa agua de beber, el gento in rio e a mística sensação de criar-se algo... Começarei então por um one note samba entrelinhado com um Al Berto Nick cavizado onde alinharei um chega de saudade fio condutor à um lirismo Lou Reed complexado in meditation... I don´t know just where I´m goin´... Depois.

In berimbau e how insensitive frio acto de escrever acabarei este meu processo criativo... Acto de liberdade in bossa nova jazz moment of reflexion sentido a flor de pele.

Revejo tudo demasiado na cor e no sabor do café. Defeito de fabrico. Talvez isso tornará a minha escrita monótona e sem fluidez... Será algo bruto e áspero onde talvez a tranquilidade jazzística não deslizará por essa salgalhada de momentos sem determinado interesse.

Apenas acho que lançar interrogações é o reflexo de lançar lanças a minha ignorância que nunca conseguirei suprimir... Para não ser agua parada de desconfiança mas sim agua em movimento de regeneração constante... Só isso... Mais nada... Pelo menos para mim e ao meu acto de criativamente tentar viver.

Vivo a insensatez pura do artista sem forças e esgotado mas pronto para retomar o sinal até o extinguir da chama que lhe dá forças.

De todos os textos que ofereci para ler... Senti o parar a meio e não pegar mais... Senti a leitura e a tentativa de analise e perceber porquê essa escrita... Respondo que por mais instrução que se aja... O acto de leitura é o bem de certos iluminados....

Isso inibe o meu acto de escrever... Pelo menos para hoje.

O acto de escrever é extremamente assustador quando se foge a regra mesmo de forma inconsciente... É rever-se eternamente em discussão retórica aberta onde há sempre um ponto para voltarmos...

Sempre tenho amigos que apreciam a minha escrita com a simpatia de ser sincera a opinião que daí veio e que recebo sempre com um sorriso na retina...


Por eles amanhã escreverei.